21/11/2005

RECUPERAÇÃO DO SETOR ESTIMULA A INDÚSTRIA NACIONAL A INVESTIR NO MODAL FERROVIÁRIO

O setor ferroviário brasileiro está a todo vapor. As 11 concessionárias, responsáveis pela administração dos 28.445 quilômetros de ferrovias brasileiras, planejam investir R$ 2,3 bilhões na revitalização da malha ferroviária em 2006.
Para o presidente da Associação Brasileira da Indústria Ferroviária (Abifer), Luis Cesario Amaro da Silveira, o setor ferroviário vive um bom momento. Ele destaca que “graças ao Plano de Revitalização, lançado em 2003, houve uma melhoria na infra-estrutura de transporte, fundamental para o desenvolvimento do País. Estamos com um bom volume de encomendas e as operadoras têm feito investimentos na malha”.
O presidente da Associação Nacional de Transportadores Ferroviários (ANTF), Elias David Nigri, confirma que existe um interesse na revitalização das ferrovias e todas as concessionárias estão em pleno processo de investimento porque entendem que a política de transporte não pode ficar restrita ao governo. Mas o presidente da Abifer ressalta que é necessário maior apoio da parte do governo. “Mesmo com as concessões, existem gargalos, como as passagens em nível e as invasões nas faixas de domínio, que são de responsabilidade do governo.
Se os gargalos não forem resolvidos, podem prejudicar o crescimento do setor”, salienta. Enquanto o governo patina para executar alguns projetos ferroviários, as concessionárias estão arregaçando as mangas. A maior parte dos investimentos foi feita pelo setor privado. Desde 1996, as concessionárias injetaram R$ 6,3 bilhões na recuperação de trilhos, vagões, locomotivas e sinalização. No mesmo período, o governo desembolsou R$ 500 milhões. Para este ano, os investimentos oficiais não devem passar dos R$ 106 milhões, contra R$ 2,1 bilhões da iniciativa privada. Hoje, 25% de tudo o que é transportado no País circula por ferrovias, com custo cerca de 18% mais baixo do que por rodovia.
Os investimentos acompanham o aumento da carga transportada que não pára de crescer. Segundo a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF), entidade que reúne oito das 11 concessionárias, no ano passado circularam pelas ferrovias mais de 200 bilhões de toneladas por quilômetro útil, contra os 130 bilhões registrados em 1997. O dinamismo do setor ferroviário reativou as fábricas de vagões e as importações de trilhos e locomotivas que não têm produtores nacionais.
Para a ANTF, o governo poderia estimular a indústria nacional mudando os critérios para empréstimos do Bndes, além da eliminação de alíquotas de importação de componentes não produzidos no País. Alguns itens chegam a pagar imposto de 54%.
As encomendas de vagões e locomotivas têm acompanhado a retomada do segmento. Em 1996, os seis vagões fabricados no Brasil foram exportados para Gana, na África. No ano passado, as 4.553 unidades produzidas ficaram no País e neste ano mais sete mil vagões passarão a integrar a frota nacional. Até 2010, a ANTF estima que mais de 100 mil vagões vão estar em operação. O número de locomotivas também é crescente: eram 1.350 em 1999, hoje 2.225 estão em operação.
A recuperação do setor também levou empresas de outras áreas a investirem na produção de equipamentos ferroviários. Uma delas é a Randon, de Caxias do Sul, fabricante de veículos e implementos rodoviários, que começou a produzir vagões há dois anos e já entregou 500 unidades para a ALL. De acordo com o diretor-executivo da divisão Implementos, Norberto José Fabris, a decisão de entrar no segmento ferroviário foi baseada na estratégia da empresa. “A definição do nosso negócio é oferecer soluções para o transporte. Além disso, olhando para o contexto pós-privatização das ferrovias, acreditamos que haveria uma mudança na matriz de transporte brasileira, hoje 64% rodoviária e 18% ferroviária. Apostamos no crescimento das ferrovias”, revela Fabris.
Os vagões Hoppler, fabricados pela Randon, específicos para o transporte de cereais, têm capacidade para 100m3 e 80 toneladas de carga. A empresa também desenvolveu um protótipo de vagão-tanque para combustíveis e óleos vegetais, com capacidade de 67m3 ou 100 mil litros, que está em fase de avaliação. Fabris acredita que o mercado se manterá estabilizado na produção de 5 a 6 mil vagões por ano. “Nosso objetivo é fabricar mil vagões em 2006 e, nos anos seguintes, aumentar a produção em pelo menos 15%”, conta Fabris.
Operadoras das malhas estão programando a ampliação da capacidade de carga do País
A MRS, que opera a malha no Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, pretende investir cerca de R$ 2,5 bilhões nos próximos cinco anos. Segundo o presidente da empresa, Júlio Fontana Neto, a concessionária planeja investimentos de R$ 657 milhões em 2006, valor 39% maior que o programado para este ano (R$ 471 milhões). Para 2007 estão planejados aportes de R$ 578 milhões. Além disso, a empresa deve iniciar em 2006 a construção da correia transportadora de minérios de ferro, uma esteira móvel de 23 quilômetros, ligando a Serra do Mar ao porto de Santos, para abastecer principalmente a siderúrgica Cosipa, em Cubatão. A inauguração deve ocorrer em meados de 2007. O projeto deverá elevar em seis milhões de toneladas o volume transportado pela companhia para Santos. Fontana diz que a companhia vai financiar os investimentos com recursos de caixa e pode vir a fazer algum acordo com organismos internacionais, como o Banco Mundial. Não há negociações com bancos nacionais neste momento.
A MRS calcula que neste ano vai transportar 110 milhões de toneladas de carga, 12% a mais do que em 2004. Até 2009 a empresa deve atingir 180 milhões de toneladas transportadas. Para tanto, a companhia necessitará de 5,2 mil novos vagões e já está em contato com fornecedores como a Randon, a Usimec, empresa do grupo Usiminas, e com a Metalmec. Segundo Fontana, a Randon ainda não tem o equipamento necessário para atender a MRS, mas as negociações para a fabricação dos vagões está em andamento.
A América Latina Logística (ALL) também planeja elevar os investimentos em 2006, dos atuais R$ 180 milhões para R$ 250 milhões. Maior operadora logística com base ferroviária da América Latina, a ALL vai acrescentar anualmente a sua frota 40 locomotivas, mil novos vagões, além da construção de terminais, em parceria com clientes nos próximos cinco anos. Os investimentos devem chegar a mais de R$ 4,2 milhões.
De acordo com o presidente da companhia, Bernardo Hees, a empresa planeja a aquisição de 10 mil toneladas de trilhos anualmente para a troca gradativa de perfil da via, ampliando a capacidade de movimentação de cargas em toda a malha da região Sul, e a reforma de outros 1,2 mil vagões. A empresa também iniciou uma série de investimentos em segurança, como a instalação de 200 novos detetores de descarrilamento e melhorias na cerca eletrônica, que garantirão maior segurança na operação ferroviária.
A Companhia Ferroviária do Nordeste (CFN) anunciou investimentos da ordem de R$ 5 bilhões, até 2009, para dar início à construção da Transnordestina - ferrovia que vai ligar os portos de Pecém, no Ceará, Suape, em Pernambuco, e a cidade de Elias Martins, no sul do Piauí. Conforme o presidente da empresa, Jayme Nicolato, o início das obras depende de negociação com sócios em potencial e os já existentes. Ele explica que será criada uma holding com participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), Fundos de Investimentos do Nordeste, CFN e outros acionistas, que ainda estão negociando a entrada no projeto, orçado em R$ 4,5 bilhões.
A expectativa é que a obra seja iniciada em junho de 2006 e comece a operar em 2009. Na avaliação de Nicolato, no próximo ano a empresa atingirá receita de mais de R$ 100 milhões, o que deve representar incremento de mais de 170% em relação aos resultados consolidados de 2005. Os recursos destinados às melhorias de vagões e vias permanentes, no ano que vem, devem somar R$ 177 milhões, valor superior aos R$ 165 milhões aplicados este ano. A CFN opera uma malha de 4.238 km.
A Brasil Ferrovias prefere direcionar seu esforços ao porto de Santos. “É o pulmão da nossa ferrovia”, destacou o presidente da companhia, Elias Nigri. Segundo ele, os investimentos totais da empresa passarão de R$ 170 milhões em 2005 para R$ 223 milhões em 2006. A empresa também aposta nos acordos de pré-embarque com os grandes processadores de grãos, como Bunge, Cargill, ADM e Maggi, para garantir encomendas de locomotivas e vagões no valor de R$ 1,3 bilhão.
Para ampliar a sua participação em um setor composto por gigantes, a Ferrovia Tereza Cristina S/A (FTC) - que opera em Santa Catarina - aposta na diversificação. A empresa tem atualmente 401 vagões, mas utiliza apenas 240. O restante é alugado, inclusive para empresas como a CFN. “No próximo ano os investimentos totalizarão R$ 8,15 milhões”, informa o diretor de operações, Luís Mário Novochadlo. “Este ano iremos fechar com um investimento de R$ 6,3 milhões”.
Falta mão-de-obra com especialização
Uma das conseqüências do aquecimento do setor ferroviário é a escassez de mão-de-obra especializada, principalmente maquinistas, o que está levando as operadoras a multiplicar convênios ou improvisar cursos de treinamento. Este ano os empregos nas ferrovias de carga deve superar a marca de 30 mil, 50 % superior ao número de 2002 (quando havia 20.215 postos de trabalho). Em 2004, o crescimento foi de 32 % e o número de empregos terceirizados mais do que dobrou.

Fonte: Jornal do Comércio

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