Modelos de financiamento são desafio na infraestrutura
Mais do que obter recursos num quadro de forte restrição fiscal, o desafio do Brasil para destravar os investimentos em infraestrutura é definir os modelos de financiamento e dar maior previsibilidade aos projetos. A avaliação foi feita por participantes do evento "Como dinamizar o setor de infraestrutura", promovido ontem pelo Valor. O Programa de Parcerias de Investimento (PPI) é considerado um primeiro passo na direção correta, mas insuficiente para resolver todos os gargalos.
O governo federal está tomando as medidas necessárias para organizar o setor e criar condições para que os agentes financeiros participem dos projetos, disse o vice-presidente da Caixa Econômica Federal, Paulo Galli. A Caixa, afirmou, terá dois papéis nessa agenda: como fornecedora de funding, usando recursos do Fundo de Investimento do FGTS (FI-FGTS), e também como agente financeiro. O banco estará presente em todas as Parcerias Público-Privadas (PPPs) e está apto a participar da privatização da Celg D, cujo leilão ocorrerá na quarta-feira, informou Galli. "Estamos alinhados com o governo federal nos projetos de infraestrutura."
O PPI é fundamental para reaquecer a atividade econômica e, se devidamente implementado, terá impacto positivo de R$ 187 bilhões no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, segundo cálculos da GO Associados. O efeito multiplicador viria de R$ 67 bilhões em investimentos, sendo R$ 25,8 bilhões em saneamento, R$ 17,15 bilhões em ferrovias, R$ 8,4 bilhões em aeroportos, R$ 8,3 bilhões em energia e, por fim, R$ 1 bilhão em portos.
"Essa é a primeira indicação de como a infraestrutura reverte de maneira positiva para a sociedade", afirmou Fernando Marcato, sócio da consultoria, que estimou ainda geração de 2,7 milhões de empregos, R$ 19,4 bilhões em arrecadação de impostos e R$ 28,7 bilhões em salários com o PPI. As vantagens econômicas são claras, mas também é preciso mitigar riscos sociais das obras, dado que o licenciamento ambiental não tem cumprido esse objetivo, disse Marcato. Para isso, sugeriu que as empresas tenham atuação mais proativa, fazendo um mapeamento adequado do potencial de impactos sociais de cada projeto.
O PPI é ambicioso, mas um desafio para a sua implementação é o ambiente de negócios, avaliou Martin Raiser, diretor-geral do Banco Mundial para o Brasil. "Para isso não é necessário melhorar só as regras da infraestrutura, mas também outras regras que impedem o investimento privado, como a carga tributária", disse, acrescentando que há recursos disponíveis para financiar os projetos. "Dinheiro tem. Não tem o planejamento de projetos bem preparados."
Hector Gomez, gerente no Brasil da Internacional Finance Corporation (IFC), braço de financiamento do Banco Mundial ao setor privado, concordou que o desafio dos investimentos em infraestrutura é de estruturação. Gomez defendeu uma atuação mais relevante das instituições multilaterais e de bancos de desenvolvimento para mitigar o risco de construção dos projetos e assim conseguir atrair primeiros investidores de longo prazo e, depois, o mercado de capitais.
Outro desafio está ligado ao próprio mercado de capitais, que hoje não tem liquidez para atrair grandes investidores. "Não há como desenvolver o financiamento de longo prazo com investidores de varejo. Este é um mercado para o investidor institucional", disse o gerente. Marcio Santiago, sócio da butique de investimentos G5 Evercore, estimou que os seis maiores fundos de pensão brasileiros gerenciam carteiras de R$ 740 bilhões, montante que sobe a R$ 1,4 trilhão acrescentando seguradoras. Esse valor se encaixa nas necessidades dos projetos de infraestrutura, afirmou ele.
Para Santiago, no entanto, o PPI é apenas um ponto de partida, e não um conjunto de projetos que vai resolver todos os gargalos do país. Maurício Endo, sócio da KPMG, considerou ainda que falta uma agenda de longo prazo para o setor, dado que, na área de infraestrutura, projetos bem-sucedidos levam dez anos para serem concluídos. No Brasil, porém, esses ciclos de projetos, relacionados às eleições presidenciais, ocorrem de quatro em quatro anos.
Fonte: Valor Econômico